Para falarmos sobre prevenção de conflitos, creio ser oportuno começarmos por entender o que é conflito e por que eles surgem. Uma das definições mais elucidativas que já ouvi diz que conflito é “qualquer situação onde exista uma oposição pessoal, interpessoal ou grupal sobre algum interesse ou valor. Essas oposições surgem quando as pessoas contestam idéias, atitudes e/ou comportamentos, se apegam aos seus pontos de vista e lutam por eles, muitas vezes de forma irracional.”
Sabemos que os conflitos se originam no processo de comunicação humana, na maioria das vezes, inconscientemente. De forma geral, não temos a intenção de gerar ou participar de uma situação conflituosa e desgastante. Mesmo assim, freqüentemente nos damos conta de que já estamos envolvidos em uma dessas situações, sem saber exatamente como ela começou.
Para aprofundar um pouco mais este tema, precisamos entender melhor o processo básico de comunicação, o qual surge da interação e da intenção do emissor em transmitir uma mensagem ao(s) receptor (es), independente do meio que se utiliza para tal. Parece simples, não é mesmo? Porém, o que vemos acontecer, na prática, é uma grande dificuldade em se atingir este objetivo.
Geralmente, não somos bem compreendidos porque não conseguimos transmitir assertivamente aquilo que pretendemos. E para quem não sabe muito bem o que é assertividade pela recente banalização deste termo, vale lembrar que é ter a capacidade de expor – de maneira clara, madura e não-agressiva – o que se pensa, sente ou quer. Mas como somos “formatados” desde crianças para buscar aceitação social, acabamos dizendo aquilo que o outro gostaria de ouvir, o que nem sempre corresponde ao que gostaríamos de falar.
Olhando agora a questão sob outra perspectiva percebemos que, quando falamos, tendemos a partir do pressuposto que o outro está recebendo nossa mensagem da forma como a concebemos, ou seja, sem nenhuma interpretação pessoal. No entanto, nossas palavras são captadas por nosso interlocutor passando obrigatoriamente por seus filtros mentais, que por sua vez são fruto de suas referências e experiências anteriores, as quais decididamente não são semelhantes às nossas. Pessoas distintas, mundos distintos... Quando nos expressamos estamos colocando em palavras (além, é claro, da linguagem não verbal) nosso mundo interno, composto por idéias, pensamentos, sentimentos, sensações, intuições, valores e crenças pessoais. Em outras palavras, nossa comunicação verbal e não-verbal é a representação do nosso mundo interno interagindo com o mundo externo.
Neste processo é comum e involuntário que usemos omissões, pois tentamos falar sobre uma experiência complexa e detalhada por meio de uma descrição verbal limitada, que fatalmente suprimirá uma grande parte da experiência em si.
Por outro lado, cada vez que ouvimos alguém, recorremos às nossas próprias experiências pessoais para fazer uma representação interna do que a outra pessoa fala para sermos capazes de compreendê-la. E isto ocorre o tempo todo, com todas as pessoas, acrescido das famosas generalizações e distorções que coroam o processo.
Bem, considerando somente estes fatores básicos de transmissão e processamento de mensagens já conseguimos vislumbrar o quão complexo é o processo de comunicação e como se torna fácil a geração de conflitos decorrentes do mesmo.
Ah, então nos basta conhecer um pouco melhor este processo e interferir conscientemente na qualidade de nossa fala para prevenirmos muitos conflitos, certo? Errado! As empresas investem altas somas em treinamentos de comunicação para seus colaboradores e os conflitos continuam brotando incessantemente nos ambientes corporativos.
Olhando de uma perspectiva ainda mais ampla, devemos admitir que conflitos são inevitáveis na vida em sociedade, de modo que tentar eliminá-los é simplesmente uma utopia. Aliás, vale ressaltar que eles não são necessariamente negativos. Em algumas situações promovem a oportunidade de crescimento e coesão entre as pessoas, permitindo o desenvolvimento de uma maior capacidade de compreensão, estímulo à mudança, motivação para resolver problemas, transformação de valores e, sobretudo, aprofundamento de relacionamentos. Mas tentar prevenir os excessos de conflitos (que se tornam grandes desperdiçadores de tempo e energia) e lidar com eles de forma inteligente é uma posição benéfica e realista.
Como podemos prevenir esses excessos, então? A meu ver, o caminho mais curto rumo a uma solução está em desenvolvermos a capacidade de sermos mais assertivos e de estabelecermos um ambiente de confiança com as pessoas com as quais convivemos, estimulando relacionamentos que abrem menos brechas a situações ambíguas. E como fazer isso? Desapegando-nos um pouco de nosso “ego” e nos apaixonando menos por nossas próprias idéias. Como pré-requisito a esta conquista, precisamos reavaliar como anda nossa maturidade emocional e nosso auto-conceito.
Observem que, quando defendemos nossas posições com unhas e dentes, muitas vezes de forma insana, uma série de significados implícitos, subliminares, está presente, nos proporcionando emoções que suprem fragilidades normalmente não percebidas ou, pelo menos, não admitidas por nós mesmos. E, se não as admitimos, não as resolvemos, e repetimos sempre o mesmo padrão de comportamento obtendo sempre os mesmos resultados.
Como podemos ver, a prevenção de conflitos começa na motivação pessoal de fazer uma auto-análise, por meio de um questionamento sincero sobre nossa capacidade de ouvir o outro verdadeira e completamente, sem precisar interrompê-lo ou contestá-lo antes mesmo que sua frase esteja terminada. Ou, ainda, observando como anda nossa capacidade de aceitar que os outros têm todo o direito de discordar de nossas idéias e pontos de vista, sem com isso nos sentirmos rejeitados, diminuídos ou incompreendidos.
Outro ponto importante na prevenção de conflitos é a real aceitação das inevitáveis diferenças que existem entre as mais diversas personalidades que povoam nossos ambientes sociais e a compreensão de que não existem verdade nem razão absoluta, somente verdades e razões pessoais, relativas, desenvolvidas a partir de um ponto de vista individual e único.
Sendo assim, percebo que no ambiente corporativo existem técnicas e teorias sobre este tema, que visam a minimizar as perdas de negócios geradas por conflitos declarados ou “mascarados” no ambiente de trabalho, que minam a lucratividade das empresas, a qualidade dos relacionamentos e o clima organizacional. No entanto, para que tais técnicas sejam bem utilizadas e alcancem seus objetivos adequadamente, precisamos estimular as pessoas a se abrirem a um processo reflexivo de auto-desenvolvimento, visando elevar a cada dia sua maturidade emocional, a qual alicerça nossas ações e comportamentos. Este foi, é e continuará sendo o grande desafio a ser enfrentado por quem busca prevenir conflitos em quaisquer ambientes sociais.
*Sandra Cruz é consultora de carreira da BSP Career em coaching, career counseling e gestão de carreira. Graduada em Letras pela UERJ, possui formação em Coaching Integrado pelo ICI – Integrated Coaching Institute e certificação como Master Practitioner e Trainer em PNL pela Sociedade Brasileira de Programação Neurolingüística. Experiência profissional de mais de 20 anos em empresas nacionais e multinacionais onde ocupou cargos executivos nas áreas de Recursos Humanos, Administração e Finanças.