Tanto por e-mail quanto ao vivo, nas minhas palestras, recebo com freqüência perguntas do tipo: 'Mas é pra valer mesmo essa conversa de que vão melhorar as relações nas empresas? Que serão realmente implantados programas eficazes voltados para a qualidade de vida das pessoas?' - e principalmente: 'Será que os dirigentes estão mesmo preocupados com isso?'.
O questionamento faz sentido porque, com relação a este tema, todo mundo está cansado de presenciar, em muitas empresas, discursos que não coincidem com a realidade e vice-versa. Então, convenhamos, dá mesmo para a turma ficar com um pé atrás. Pessoalmente acredito que essas mudanças na relação capital/trabalho, visando torná-la mais humana, afetiva, descontraída e ética - sem nenhum prejuízo ao profissionalismo e aos resultados- são irreversíveis. Creio que é uma tendência natural, exigida pelo amadurecimento das pessoas e que, portanto, sua disseminação e prática é apenas uma questão de tempo. Se é verdade que os que fizerem primeiro levarão grande vantagem, também é verdade que os resistentes levarão a pior. Paralisados pelas questões exclusivamente técnicas e financeiras, não perceberão que a produção, a venda e o lucro advêm da ação humana e que é a partir da excelência desta que todos cresceremos - inclusive técnica e financeiramente.
A equação pode ser vista de uma maneira muito simples: todo mundo quer ser feliz e tem esse direito - e o trabalho, ao qual dedicamos mais de 12 horas diárias do nosso tempo (computado desde a hora que levantamos da cama até à hora que voltamos para casa), é um componente fundamental na composição da chamada Felicidade. Daí, lutar para equilibrar a vida pessoal com a vida profissional é talvez um dos primeiros passos para que essas mudanças se efetivem.
Justamente neste sentido, fiquei muito feliz com o que li num encarte informativo do CONARH 2002, inserido no jornal O ESTADO DE SÃO PAULO. Na página 8 do encarte há um texto intitulado 'Estudo investiga sonho de presidentes de empresas', que apresenta algumas conclusões extraídas de pesquisa feita junto a 60 presidentes de empresas pela consultoria Monitor Group para a ABRH (Associação Brasileira de Recursos Humanos). O que vou comentar a seguir baseia-se no referido texto, uma vez que não tive ainda acesso às conclusões totais da citada pesquisa.
Se entendi bem as conclusões apresentadas, as coisas vão REALMENTE mudar. Acompanhem meu raciocínio. Na pesquisa, há 3 perguntas sobre sonhos que me chamaram a atenção e uma quarta que me surpreendeu - neste caso, não a pergunta, mas a resposta. As 3 perguntas, dentre outras feitas para os 60 presidentes, são:
1. Quais são os seus maiores sonhos para sua empresa?
2. Quais são os seus maiores sonhos para o Brasil?
3. Quais são os seus maiores sonhos para a sua vida pessoal? - e aqui vale a pena transcrever as 3 principais respostas a esta terceira pergunta:
'1. Conseguir equilibrar melhor a dedicação ao trabalho e à minha vida pessoal.
2 Investir mais na saúde e na qualidade de vida.
3 Garantir o futuro dos meus filhos'.
Tenho certeza de que as respostas dadas à terceira pergunta não seriam muito diferentes se ela fosse feita a todos os demais funcionários das empresas dos presidentes envolvidos - e, de resto, a todos os funcionários de qualquer nível hierárquico de quaisquer outras empresas. Mas, já que existem maniqueístas de plantão que, de forma radical, vêem todos os empresários como seres insensíveis, é bom saber e divulgar que há também aqueles que têm a mesma preocupação dos colaboradores em buscar e curtir a Felicidade. Também é bom saber e divulgar que nem todos eles são 'workaholics'. E que, portanto, os programas de qualidade de vida promovidos pelas áreas de RH devem também incluí-los como participantes.
Mas o que me pareceu mais surpreendente - agradavelmente surpreendente, aliás - foi a resposta da 4a. pergunta: Como os presidentes priorizam os seus sonhos? Eis as respostas:
47% - Sonhos para a vida pessoal.
38% - Sonhos para o Brasil
15% - Sonhos para sua empresa
Não é formidável? Praticamente a metade dos presidentes pesquisados sonha mais com a excelência da sua vida pessoal do que com as outras duas alternativas! E por que isso é tão formidável assim? Porque, obviamente, este é o primeiro passo para a empatia dos presidentes com os sonhos dos seus colaboradores - que, como já disse, são iguais ou muito parecidos!
Da empatia vem a sensibilização e desta, vem a decisão política de agir. E, como sabemos, quando a cúpula adota um Projeto, ele sai do papel e se torna ação. Isso acontecendo, todos sairão ganhando, porque, nos assuntos inerentes ao ser humano numa empresa, o que for feito para a felicidade do presidente certamente também o será para a felicidade do trabalhador. Afinal, equilíbrio entre vida pessoal e profissional, saúde, qualidade de vida e defesa da família são temas de interesse comum a qualquer funcionário numa empresa, do presidente ao porteiro.
Enfim, se tomarmos como válida a amostragem das 60 empresas pesquisadas pela Monitor Group, podemos todos alimentar, a partir das respostas, uma enorme expectativa de melhoria da qualidade de vida no trabalho naquelas empresas, que darão o bom exemplo.
A questão, então, passa a depender exclusivamente da disposição, dos recursos e da coragem para transformar sonhos em realidade. Sobretudo coragem - para implantar programas de qualidade de vida com mecanismos e condições que os façam sobreviver a despeito das oscilações da Bolsa, do dólar, do risco Brasil e de quem será o novo presidente do Brasil. Os responsáveis pelas empresas devem ter sempre em mente que, tanto no campo pessoal quanto no organizacional, é nas crises que o sorriso se torna mais indispensável porque quebra resistências, facilita negociações e gera forças para a sobrevivência.
Inversamente, se as empresas não acreditarem que, mesmo em épocas turbulentas e nervosas, é possível manter um clima interno com um mínimo de alegria, afetividade, serenidade e otimismo, passaremos a ter também caos emocional nas organizações e aí, sim, as coisas passarão a ser muito, mas muito piores mesmo. Por isso, que bom que vários presidentes de empresas priorizem seus sonhos de uma vida pessoal e profissional mais equilibrada, de mais investimento na saúde e na qualidade de vida.
Esses sonhos transformados em prática significam produzir felicidade no trabalho! Por isso estão de parabéns esses presidentes. Com tantas cabeças dependendo das suas, é reconfortante saber que nelas há espaço para esses sonhos. Caso contrário, e caso essa disposição não seja disseminada entre outros presidentes, será sombriamente inevitável questionar se dentro de algum tempo ainda haverá vida antes da morte nas organizações.