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Quer ir para a China? China?
por Você SA
Publicada em 18/9/2006

Há 2 600 brasileiros desfrutando do milagre econômico chinês. Conheça os desafios e as dificuldades de alguns deles

Por Anne Dias

Durante mais de uma década, o engenheiro mecânico Fernando Grangeiro, de 36 anos, trabalhou na Bosch no Brasil. Em 2002, ele decidiu candidatar-se para uma vaga na China e ficou com o cargo. Seus planos são de ficar por lá mais três anos. Fernando foi comandar a filial da multinacional alemã na cidade chinesa de Chuzhou. Assim como ele, outros 2 600 brasileiros foram participar do milagre econômico chinês, de acordo com o Itamaraty. Dos 87 executivos expatriados da Embraer em vários países, por exemplo, 11 desembarcaram em Harbin, onde está sua fábrica.

No caso de Fernando, duas razões explicam a escolha para liderar o chão de fábrica da Bosch em Chuzhou. A primeira foi a disposição dos alemães para contratar um brasileiro para a nova filial. O que fazia todo sentido, já que a unidade iria fabricar injetores e bombas movidos a diesel semelhantes aos feitos por aqui. A segunda razão teve a ver com o perfil de Fernando. Além da familiaridade com o produto, ele é fluente em inglês, tem experiência como líder e ampla bagagem técnica. Além disso, já havia morado na Alemanha por dois anos e não tinha filhos na época. Com tantos pontos positivos, Fernando passou com tranqüilidade pelo processo de seleção. 'A China está fervilhando de oportunidades de negócios', diz o engenheiro. 'O país recebeu o maior investimento da Bosch no mundo, e sempre achei que seria uma experiência fantástica.' Tem sido mesmo.

Mas o começo não foi fácil. A princípio, pelo comportamento dos operários na fábrica. Os chineses são reservados. Se durante uma explicação alguém fica com uma dúvida, dificilmente o chefe estrangeiro percebe. Os operários não esboçam reação alguma, não torcem o nariz ou franzem a testa. 'É difícil saber se estão entendendo, se concordam ou discordam', diz Fernando, que anda pela fábrica acompanhado por um intérprete. O executivo fala em inglês e seu tradutor repete as orientações em mandarim. 'É uma língua intransponível', diz. O idioma é citado pelos executivos como o maior entrave à adaptação. Enquanto as conversas acontecem nos escritórios, tudo bem. O inglês é liberado. O problema é que os operários chineses só falam em mandarim.

POUCAS VAGAS ­
'Não se deve esperar uma explosão de empregos para brasileiros na China. Em geral, as vagas surgem a partir de investimentos das nossas multinacionais', afirma Maria Tereza Fleury, diretora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA), da Universidade de São Paulo (USP). Ela passou 15 dias na China em junho passado. Foi acompanhar um grupo de alunos de MBA. Digamos, porém, que a vaga surja na sua frente. Quem deveria embarcar numa empreitada dessas? 'Quem aceita grandes mudanças', diz Silvia Sigaud, sócia da consultoria Korn/Ferry, de São Paulo. Silvia atendeu dois bancos e uma empresa de commodity agrícola que estavam recrutando seis executivos brasileiros para a Terra do Dragão. Ela preencheu as vagas com cinco homens e uma mulher.

Em geral, quem vai para a China fica três anos por lá. Esse é o tempo médio para elaborar, implantar e executar um projeto. 'Quando retornam ao Brasil, esses executivos são vistos como pessoas com pensamento global e estratégico', diz Aline Zimermann, sócia da Fesa Global Recruiters, de São Paulo. A volta pode não significar uma promoção, mas certamente representa um ponto a mais na preferência dos headhunters. Por isso, o que também atrai executivos para a China vira uma vantagem competitiva.

O engenheiro mecânico Mauro Santos, de 45 anos, gestor de suprimentos da Embraco, mora em Beijim há sete anos. Uma de suas dificuldades no começo era entender como se davam as negociações com os chineses. 'O tempo é outro', diz Mauro. Uma cláusula que facilmente seria resolvida entre os advogados das duas partes muitas vezes consome meses de discussão. Enquanto os chineses não estiverem totalmente convencidos, nada feito. Em geral, os contratos pedem garantias em caso de problemas. Entretanto, um acordo verbal vale mais do que o papel assinado. 'Os chineses querem ter certeza de que podem confiar em seus parceiros', diz Mauro. Por causa das dificuldades culturais e da língua, os estrangeiros tentam se cercar de cuidados à mesa de negociação. O engenheiro metalúrgico Christian Besse, de 51 anos, mora em Nanjing há dois anos e meio e ainda encontra dificuldade para falar um pouco de mandarim. Numa negociação, ele leva um executivo chinês mais experiente no assunto a ser tratado.

PACIÊNCIA CHINESA ­
Christian é responsável por uma empresa metalúrgica que fabrica tubos e conexões de ferro fundido do grupo francês Saint Gobain, que no Brasil controla a Santa Marina. Sua unidade lá tem cerca de 1 000 funcionários. 'É preciso ter paciência para lidar com os operários e até com os executivos chineses', diz Christian, que nasceu em São Paulo. Outro ponto estressante é a pirataria. Os chineses, como se sabe, copiam e reproduzem tudo com menor custo. Por isso a inovação tem de ser rápida e o executivo precisa ser ágil o bastante para armar a contra-ofensiva da organização diante da concorrência desleal. 'Aqui se copia até compressor de geladeira', diz Mauro, da Embraco.

A vida dos brasileiros na China é duríssima. Trabalha-se no mínimo dez horas por dia e não existe folga de fim de semana. A tradição local reza que quem não trabalha não ganha. Por essas e outras, os brasileiros que vão para a China precisam do respaldo da família. Fernando Grangeiro, da Bosch, foi para lá com a mulher, Patrícia, com quem está casado há cinco anos. Hoje eles são pais de Rafael, de 2 anos, e Carolina, de 6 meses, ambos nascidos em Xangai. 'Se a família está bem, o executivo fica bem', diz Fernando. Já Lílian, mulher de Mauro, da Embraco, mergulhou no mandarim e hoje ganha a vida como tradutora. Adora cantar músicas chinesas e até já participou de alguns concursos de canto por lá.

Segundo o presidente da Câmara Brasil-China de Desenvolvimento Econômico, Paul Liu, os estrangeiros que ocupam as melhores posições na China, ao menos, não sofrem preconceito. Afinal, eles ocupam vagas destinadas a brasileiros em multinacionais brasileiras. Não tomam espaço dos nativos, e os chineses sabem disso. O pacote de vantagens oferecido pelas companhias para quem aceita o convite costuma ser atraente. A empresa é quem arca com aluguel da casa, banca carro, motorista, tradutor, escola para os filhos e outros gastos. Não há, no entanto, um reajuste salarial espetacular. 'As multinacionais têm uma tabela de custo de vida em cada país e o aumento real de salário não passa de 20% no caso da China', afirma o consultor Carlos Diz, do Rio de Janeiro.  

NA TERRA DO DRAGÃO
Os executivos brasileiros que vão trabalhar na China são:
* Flexíveis e se adaptam facilmente a mudanças
* Homens entre 30 e 50 anos
* Pais com filhos em fase pré-escolar (poucas cidades têm escolas internacionais, daí a dificuldade para levar filhos em idade escolar)
* Sociáveis e falam inglês fluentemente

EFEITO COLATERAL
A China detonou uma bomba e pouca gente percebeu o estrago que ela causou. Assim que abriu as portas para as multinacionais oferecendo mão-de-obra e custos muito baratos, o país enfraqueceu as relações de trabalho no mundo. Em uma recente análise, a revista inglesa The Economist mostra que a entrada da China, da Índia e da ex-União Soviética na economia mundial dobrou a força de trabalho. Com isso, o poder de barganha de sindicatos do mundo inteiro teria se esfacelado. Provavelmente por isso, diz a revista, salários e benefícios tenham crescido apenas 11% desde 2001 nas empresas privadas dos Estados Unidos, ante 17% nos cinco anos anteriores.


Artigo fornecido pela revista VOCÊ S/A.
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