Empresas terceirizam cada vez mais seus eventos e criam oportunidades para quem quer trabalhar com promoção de festas e seminários
Por Maurício Oliveira
Antigamente, as festas de casamento eram todas organizadas em casa. A mãe da noiva preparava os salgadinhos, o pai fechava o aluguel do salão, uma tia fazia o buquê e a vizinha costurava o vestido. Hoje, raros são os casais que abrem mão da comodidade de contratar profissionais para cuidar de tantos detalhes. Processo semelhante ocorreu nas corporações em relação aos seus eventos mais importantes, como lançamentos de produtos, convenções de funcionários ou ações de marketing para reforçar a marca. Tudo isso deixou de ser tocado por secretárias e até pelos departamentos de relações públicas. Ultimamente, as ações do gênero são entregues a profissionais dedicados exclusivamente ao tema. Muitas companhias até criaram o cargo de coordenador de eventos, responsável pela concepção inicial dos projetos e pela contratação de agências especializadas em transformá-los em realidade. Essa terceirização está criando um novo e promissor campo de trabalho na área de eventos no país.
Não há estatísticas confiáveis sobre esse fenômeno. Mas profissionais do segmento já perceberam que as oportunidades dentro das empresas e nas agências especializadas estão se multiplicando. 'Há várias portas de entrada para esse mercado. E depois que você entra pode transitar à vontade por ele', diz a paulista Vanessa L'Abbate, de 33 anos, diretora de atendimento da House Eventos. O caso de Vanessa é simbólico. Formada em marketing, ela trabalhava na empresa de telefonia BCP (que depois se transformou na Claro) quando recebeu um convite do departamento de recursos humanos para assumir o então recém-criado cargo de coordenadora de eventos. A proposta significou uma promoção do nível de analista para o de analista sênior, mais um aumento de 20% no salário. 'Aceitei com certo receio de que não gostasse do trabalho, mas nunca me senti tão realizada', afirma Vanessa. No final do ano passado, ela aceitou o convite da House, uma das agências que prestavam serviços para a Claro. 'Achei que seria fundamental ter experiências variadas na minha carreira', diz. Vanessa assumiu o cargo de diretora de atendimento, responsável pela prospecção de novos clientes, com remuneração vinculada aos resultados.
Os salários no segmento variam bastante. A rigor, quem está começando tem uma remuneração em torno de 2 000 reais. Mas as chances de crescimento rápido são grandes, elevando os ganhos para a faixa de 8 000 a 12 000 reais mensais. Isso depende, claro, da responsabilidade que o profissional assume. Ela aumenta na medida em que os eventos organizados pelas empresas ganham maior dimensão e visibilidade. Por exemplo, ao envolver grandes espetáculos artísticos, musicais e esportivos. Os projetos têm início, geralmente, apenas com dois elementos definidos: o prazo e a verba. Daí em diante, é preciso planejamento, criatividade e troca de idéias com o cliente e os colegas de trabalho até chegar ao resultado final.
Um dos maiores desafios de Vanessa quando trabalhava na Claro foi organizar a participação da empresa na Telexpo no ano passado. A feira, em que as novidades da área de telecomunicações são apresentadas ao público e ao mercado, é tida como estratégica no setor. Vanessa se dedicou intensamente ao projeto durante três meses -- para uma feira que durou apenas três dias. 'Meu trabalho começou no momento de escolher o espaço dentro da feira e passou pela concepção do estande, da preparação da infra-estrutura física, das atrações para o público, tudo isso envolvendo reuniões e brainstorms com diferentes departamentos da empresa', diz. Trabalhando agora em uma agência prestadora de serviços, Vanessa já percebeu que igualmente trabalhosa é a fase de prospecção de clientes. As grandes empresas normalmente fazem concorrências para qualificar as agências, que, a partir da aprovação, ficam disponíveis para jobs. A seleção do Santander Banespa, por exemplo, envolveu 25 candidatas, das quais quatro foram aprovadas -- entre elas a House. 'A expansão do mercado atrai muita gente despreparada, mas só há espaço para profissionais', diz Rute Lima e Silva, dona da House.
Outro desafio para quem cresce nesse campo é lidar com toda espécie de contratempos. Desde o fornecedor que atrasa a entrega de camisetas a uma repentina falta de energia ou de água. Para ter uma idéia, quem assume um evento chega a lidar com 70 a 100 colaboradores, como o pessoal de bufê, som, banheiro químico, entre outros. A grande missão é evitar contratempos. Dois exemplos negativos recentes, ambos ocorridos em janeiro deste ano, envolvendo o grupo Pão de Açúcar, dão a dimensão desse desafio. O primeiro foi a confusão na venda de ingressos para os shows em São Paulo da banda irlandesa U2. As pessoas que aguardavam na fila ficaram tão revoltadas com o atendimento que muitas passaram a gritar os nomes dos concorrentes da rede de supermercados. Muito mais grave foi o tumulto que resultou na morte de três pessoas durante sessão de autógrafos do grupo mexicano RBD, promovida no estacionamento de um shopping na zona sul de São Paulo, evento patrocinado pelo supermercado Extra, do grupo Pão de Açúcar. Os organizadores previram que o evento seria acompanhado por um número muito menor de pessoas e foram surpreendidos não apenas pelo excesso de gente como pela histeria dos fãs.
PROFISSIONALIZAÇÃO
Apesar dos riscos e dos custos envolvidos, no entanto, o chamado 'marketing de relacionamento' -- que é o planejamento de ações específicas para estreitar os laços com uma determinada faixa de clientes -- ganha força cada vez maior no Brasil. De acordo com pesquisa da Associação de Marketing Promocional, 95% das empresas de médio e grande portes do país incluíram os eventos para clientes e funcionários entre suas ações regulares no ano passado, ante 77% em 2004. Daí haver uma cobrança por profissionalização na área. Um bom curso no ramo é promovido pelo Senac de São Paulo. A instituição oferece, em quatro unidades da capital paulista, pós-graduação em administração e organização de eventos, freqüentada no ano passado por cem alunos, 60% dos quais já atuavam na área. 'Ter conhecimentos em gestão de recursos, negociação e administração de pessoas se tornou essencial para entrar e se manter nesse mercado', diz Helga Gentil, coordenadora da área de eventos do Senac São Paulo.
O diferencial de um evento nem sempre precisa ser o show de um cantor famoso, algo tido como lugar-comum entre os profissionais da área. No caso da festa de integração da Tim Nordeste, no final do ano passado, o que mais chamou a atenção dos 1 400 convidados foi a trupe de barmen performáticos que faziam malabarismo com as garrafas. Outro detalhe curioso foi o convite: um pingente para celular trazia o código de barra que dava acesso à festa. 'Se a festa fica na memória de quem participa, nossa missão está cumprida', diz Cláudio Xavier, diretor da New Stile, de Recife. A agência tem 17 anos e comemora um crescimento de 120% nos últimos três anos, com o número de funcionários fixos saltando de 55 para 90 nesse período. Entre os clientes, além da Tim, estão Ambev, Bauducco, Gradiente e Visa.
Rute, da House, esclarece que o principal ativo de um profissional da área é mesmo a experiência -- o que, naturalmente, não se consegue de um dia para o outro. Por isso ela cita o exemplo da Vanessa. Embora tenha relativamente pouco tempo de carreira em eventos, Vanessa já esteve nos dois lados do balcão e ainda fez pós-graduação. 'O caso dela mostra que o caminho é aproveitar as oportunidades e se dedicar muito', diz Rute.
Qual seria então o perfil ideal para atuarem eventos corporativos? As formações mais desejadas por quem contrata são publicidade, relações públicas, marketing e turismo. Mas há espaço para profissionais de qualquer área, já que existem vários tipos de trabalho dentro de uma grande agência especializada em eventos. Elas têm estrutura semelhante à das agências de publicidade, com departamentos de atendimento, criação, planejamento e produção. 'O mais importante é apresentar certas características pessoais como ter iniciativa, ser objetivo e trabalhar bem em equipe', diz Sueli Brusco, diretora executiva do Sim Group, de São Paulo, que tem Volkswagen, Votorantim e Perdigão entre seus clientes.
IMAGINAÇÃO SEM LIMITE
O diretor da agência Ajom, Celso Antunes, de 36 anos, de São Paulo, destaca mais uma prerrogativa para atuar na área: estar muito bem informado e antenado com o que acontece no mundo. 'Nos 15 anos em que atuo com eventos assisti a uma tremenda evolução dos velhos audiovisuais para a era dos megaeventos', diz. Um dos cases recentes em que Celso atuou foi no lançamento da Zafira 2005 para a General Motors. No primeiro dia, a atração foi uma peça de teatro com a família Goulart. Embora escrita pelo dramaturgo profissional Emilio Boechat e ensaiada para valer pelos cinco atores, a peça teve uma única apresentação, exclusiva para os representantes da rede de distribuidores da GM em todo o país e seus acompanhantes -- totalizando cerca de 800 espectadores. No dia seguinte, houve um show que uniu Gal Costa, Simone e Daniela Mercury cantando músicas de Dorival Caymmi, acompanhado por 1 200 pessoas -- o mesmo público da peça da família Goulart e mais 400 formadores de opinião. Todo o planejamento dos eventos se deu com base no briefing de que a Zafira é o 'carro da família'. Na peça de teatro, o carro surgiu na última cena (dirigido pelo presidente da GM no Brasil, Ray Young, que fez uma 'ponta'), como a grande surpresa que o marido preparou para a mulher em celebração ao aniversário de casamento. Já o espetáculo musical foi precedido por uma apresentação de dança em que os bailarinos saíam de dentro do carro. 'O mais estimulante do nosso trabalho é que não há limites para a imaginação', diz Celso. 'Às vezes, o mais difícil é fazer com que o cliente compre a nossa idéia.'
CAÇA AOS TALENTOS
As agências que promovem eventos para empresas priorizam a contratação de profissionais formados em:
* Publicidade
* Relações Públicas
* Marketing
* Turismo