Em 1926 o físico alemão Werner Heisenberg formulou seu famoso “princípio da incerteza”.
E daí, o que é que eu tenho com isso?
É uma pergunta interessante, pois a primeira impressão que temos é que as grandes descobertas científicas só chegam até o homem comum através de tecnologias que se transformam em equipamentos de uso comum. |
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Nunca paramos, por exemplo, para pensar em filamentos incandescentes no vácuo quando acendemos uma lâmpada. Ou em raios catódicos quando ligamos a TV. Ou ainda em ondas eletromagnéticas quando acessamos a Internet. No entanto, esses componentes da física existem e facilitam imensamente nossas vidinhas cotidianas.
Mas o mais impressionante não é a interferência da ciência em nosso cotidiano, e sim sua influência em nosso comportamento, ou ainda, em nosso pensamento. Acontece que o pensamento humano é construído de uma forma que escapa à nossa percepção. Os conceitos que recebemos ao longo de nossas vidas, e que criam a maneira como pensamos, vêm de quatro grandes áreas do conhecimento: a filosofia, a ciência, a arte e a religião.
Apesar de ser um conceito puramente científico, que pertence às bases da física quântica, o princípio da incerteza tem uma curiosa relação com a maneira como as pessoas pensam. Uma vez que a física é uma ciência exata, cada vez que encontramos em seus princípios, coincidências com nosso modo de pensar, aceitamos nossos pensamentos como verdadeiros, afinal, eles estão sendo referendados pela ciência.
Dizemos, por exemplo, que o pensamento cartesiano (derivado do matemático francês Renée Descartes, que criou o método científico no século XVIII) foi substituído pelo pensamento quântico-relativístico (originado pelas percepções da Teoria da Relatividade, de Einstein, e da física quântica, de Max Planck, Nils Bohr e Werner Heisenberg, principalmente).
Mas afinal o que diz o princípio da incerteza, e por que ele influi em nosso pensamento do dia-a-dia? Então vejamos: “quando desejamos prever a posição e a velocidade futuras de uma partícula, devemos ser capazes de conhecer, antes, a posição e a velocidade que essa partícula tem atualmente”.
Em termos comportamentais, significa que se você deseja mudar sua atividade, seu modo de agir, ou qualquer outro valor mutável, você deve partir do princípio que conhece bem aquilo que deve ser mudado. Caso contrário a mudança será comprometida pela inconsistência. Se você tiver uma bússola, pode saber onde é o norte, mas se não tiver a menor idéia de onde você está, essa informação será de pouca utilidade. É necessário, pelo menos mais um referencial. Em outras palavras, como saber para onde ir, se eu não sei onde estou?
Essa visão nos dá o referencial da importância do autoconhecimento, que é uma das qualidades humanas mais incentivadas pelos educadores, psicólogos, profissionais de RH, em função da necessidade de mudanças pessoais constantes para acompanhar as mudanças do mundo.
O princípio da incerteza diz mais. Diz que, pelos métodos de medição disponíveis na Física, é impossível conhecer a localização e a velocidade de uma partícula atômica ao mesmo tempo. Ou medimos sua velocidade ou conhecemos sua localização. Temos que nos contentar com uma dessas informações.
Mais uma incrível semelhança com nosso comportamento, especialmente na atualidade. Você já reparou como na vida às vezes nos deparamos com situações que também apresentam essa característica de incerteza?
Por exemplo, todos sabemos que as mudanças nas características profissionais neste início de século mostram que apesar de sempre existir trabalho, o emprego está diminuindo. Há menos emprego e mais trabalho. Há uma tendência à busca de atividades sem vínculo empregatício, mas que permitem desenvolvimento profissional e pessoal.
Essa tendência, por outro lado, provoca uma situação interessante. Ou temos trabalho ou temos emprego. E temos que fazer uma opção quase dramática. Um emprego fixo nos dá segurança, mas nos tira a liberdade. Uma atividade autônoma nos dá liberdade, mas diminui a segurança.
Está aí, mais uma vez aplicado o princípio da incerteza. Não podemos ter o dois. E agora? Pois é, o pensamento cartesiano não se aplica mais ao novo tipo de trabalho. Há vinte anos o jovem em idade de vestibular tinha três opções. Estudava medicina, engenharia ou direito. Ou ainda podia fazer concurso no Banco do Brasil, onde pretendia trabalhar até se aposentar. A vida era linear, cartesiana.
Não é mais assim. Tudo é relativo e convivemos com a incerteza.
Mas como o homem é produto de seu meio, estamos encarando essas alterações numa boa. Sem traumas convivemos com a relatividade dos valores e com a incerteza das situações buscando, e alcançando, o equilíbrio que é próprio da matéria de que somos feitos.